segunda-feira, fevereiro 21, 2011

I Never Came

Um texto torto, trôpego e denso. Um desabafo meio falho, reprimido. O relato de um estupro consentido.

Desde pequena frases ferviam em sua cabeça. Todas ao mesmo tempo, nenhuma delas concisa. Suspeitava que em seu corpo não circulava sangue, e sim combustível.

Ele dizia a ela para que não se apaixonasse, aplicara a ideia de que ela deveria ter mais agudez de espírito de forma intravenosa. ”Seja esperta”. Ela não era, mas tentou. Aditivada, resolveu banalizar o que sentia por ele. Cento e vinte batimentos por minuto. Combustão.

Pôs-se em coma. Fugiu. Por cima de outro. Seus movimentos eram mecânicos: sem falhas e sem emoção. Seu corpo seguia o fluxo numa interação forçosa. Não sentia. Não tinha vontade de. Sentia que faltava algo entre o átrio direito e o ventrículo esquerdo. Deparou-se consigo mesma. Desabou. Cento e trinta batimentos por minutos. Deflagração.

A consciência veio como um tiro de fuzil. Cada toque era uma ofensa e ela, o ofensor. A pressão daquele corpo contra o dela era uma surra no coração. Meia dúzia de palavras sujas reviraram-lhe o estômago. Queria vomitar tormento. Não mais se conteve, sabia que o assustaria, desabou em lágrimas. Tentou abafar o choro. Mas soltou soluços que se fizeram ouvir dando subitamente fim ao ato. Ela apertava os olhos expressando dor, ele consumia-se em desespero, paralizado. Ela exalava arrependimento, ele respirava culpa. Cento e cinqüenta batimentos por minuto. Conflagração.



Seguir omitindo o ocorrido não era uma possibilidade, ia contra os seus princípios. De imediato, precisava de amparo.  Tinha molestado-se, abrira uma ferida em carne viva que lhe doía na alma.  Desejava só descansar seu corpo no peito dele, sem esperteza alguma. Decidiu procurá-lo, no meio da madrugada, com uma aparência desalinhada, arriscando perder o que ainda não tinha. O sentimento por ele ocupava todo o espaço que existia nela. Cento e quarenta batimentos por minuto. Explosão.


Contou tudo o que havia feito, tudo o que sentia e evitava dizer.  Assumiu o quanto ela o queria por perto. As palavras eram de uma sinceridade quase sólida. Era assim que ela funcionava, esperteza é não mentir a quem se estima. Ele ouviu tudo com a mão dela em seu coração. E por mais que tentasse mantê-la a certa distância, se deu conta do quanto ela se aproximava. Pela primeira vez, se referia a eles no plural. Perguntou se ela tinha tirado as meias. Digeriu a confissão sentindo gosto de ciúmes.   Acolheu-a. Confessou a reciprocidade, tudo que o fazia hesitar e cedeu: Estavam juntos. E ela dormiu enaltecida no conforto do corpo dele. Cem batimentos por minuto. Contentamento.

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